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PARTE 3 – A INTERVENÇÃO GERONTOLÓGICA NO ESPAÇO PRIVADO

PARTE 3 – A INTERVENÇÃO GERONTOLÓGICA NO ESPAÇO PRIVADO

Nelson Frederico Seiffert

1-O espaço privado e adjacências

O espaço privado é descrito como o ambiente residencial da moradia (“dentro de casa”), e que pode incorporar, na situação de uma casa, o seu entorno físico imediato, envolvendo o pátio, o jardim e acesso externo. Está constituído pelos componentes físicos, naturais, construídos, estruturais, biológicos, tecnológicos, culturais, legais, que atuam sobre os moradores, e que afetam a capacidade do ambiente existente na moradia, em prestar serviços de boa qualidade às pessoas residentes.

É também de se destacar que o espaço privado estará fortemente afetado pela infraestrutura e condições de localização dentro da comunidade. A escolha de áreas residenciais e moradias que contenham elementos ambientais que contribuam ao bem estar das pessoas é uma estratégia que pode ser antecipada, antes que surjam limitações pelo processo de envelhecimento e queda da renda das famílias. A seleção da região onde se localizar, busca atender o papel de suprir abrigo, segurança, privacidade, ser uma alternativa de investimento e de identidade pessoal.

Muitas pessoas idosas vivem em residências de baixo padrão inadaptadas as necessidades de pessoas envelhecidas. Residências situadas em entornos ambientais com infraestrutura degradada, áreas ruidosas, densamente povoadas, distantes de serviços de comércio e saúde, não propiciam as condições adequadas a um processo de envelhecimento ativo.

No processo de planejamento municipal e na definição da política habitacional, os aspectos de adequação de moradias ao adensamento populacional e expansão urbana, deveriam considerar as necessidades ambientais e de estrutura residencial, de pessoas que se encontram na fase de envelhecimento, e de pessoas que são atingidas por inabilitações físicas. Existe atualmente um grande número de pessoas que são confrontadas com dificuldades para obter acomodação adequada e vem se tornando evidente que as autoridades locais precisam adotar medidas para incentivar a construção e a provisão de oferta de espaços residenciais ambientalmente amigos à população, levando em conta as necessidades de pessoas idosas (Ratclife 1992).

Um ambiente residencial desejável, para suprir uma boa qualidade de vida para a pessoa envelhecer em sua residência deveria comportar um conjunto mínimo de caraterísticas amigáveis que podem ser citadas como:

1-A região oferece opções de moradia e a um custo acessível;
2-A moradia oferece espaço, dependências e condições ambientais adequadas a idosos;
3-Os serviços de manutenção, comércio e saúde estão próximos e a um custo acessível;
4-A região do entorno oferece facilidades de integração com a comunidade;
5-Há boa disponibilidade de transporte próximo a moradia;
6-Há disponibilidade de espaços livres, praças e jardins nas proximidades;
7-Há boas condições de segurança na região da residência;
😯 local de moradia é suprido por Serviços de Atenção ao Idoso.
(Organização Mundial de Saúde 2008, Ministério da Previdência Social 2001).

O ambiente residencial é considerado como condição fundamental de bem-estar e segurança, seja em seus aspectos de localização, projeto arquitetônico, estrutura interna e acesso a serviços que influenciam a autonomia de pessoas idosas.

O custo da residência é um fator importante, seja em termos de sua construção, remodelação, bem como no que se refere a aluguel e custos de condomínio de prédios residenciais. Para a população em geral, a moradia é considerada cara e pode tornar difícil aos idosos morar de forma adequada.

Casas grandes, que foram úteis quando a família comportava toda a família, passam a ser consideradas grandes demais para pessoas aposentadas e que não tem recursos para adquirir uma nova residência ou remodelar a casa familiar. Somando-se a isto, a mudança para um novo ambiente não é bem vista pelos idosos, que são apegados ao seu entorno, e consideram um grande transtorno uma mudança nesta fase da vida. Deve ser acrescentado que, para aposentados com poucos recursos, a disponibilidade de uma nova moradia, de baixo custo, geralmente é limitada e que, a venda da casa familiar antiga pode levar um tempo prolongado para viabilizar a aquisição de uma nova residência que supra suas necessidades atuais. É importante que o idoso tenha espaço e privacidade em sua casa. Casas com um número excessivo de moradores representa um obstáculo a sua privacidade e conforto individual.

Muitos aspectos do planejamento do local da residência afetam a capacidade dos idosos morar adequadamente. É essencial, em termos de localização da moradia, que a área esteja coberta por serviços básicos públicos como abastecimento de água, esgoto, energia elétrica, transporte e de saúde. As residências devem estar construídas com materiais adequados formado estruturas seguras e localizadas em áreas que não estejam sujeitas a inundações nem deslizamentos. Que tenha superfícies niveladas evitando degraus e escadas. Se a morada for em prédios, estes precisam estar dotados de elevadores, rampas de acesso, estacionamento e locais para exercícios físicos. A moradia deve ter portas largas e seus cômodos adaptados, e que sejam grandes o suficiente, para facilitar o deslocamento de cadeiras de rodas e os serviços de manutenção residencial.

As residências necessitam estar estruturadas de forma a possibilitar a manutenção em seu interior de condições climáticas amenas, o que implica na localização adequada de janelas que permitam boa ventilação e os cômodos, de maior uso diário, deverão estar dotados de sistemas de ventilação, exaustão de ar, ou ar condicionado que assegurem refrigeração e aquecimento nos períodos críticos.

A construção ou reforma de residências amigas para idosos deveria ser parte da preocupação do setor de construção civil. Deveriam ser sugeridos incentivos para estimular arquitetos e construtores a construírem moradias para este segmento populacional, dado o fato de que representará, em poucos anos, cerca de um terço da população total do país.

A possibilidade de se adaptar uma casa ou apartamento pode representar um custo considerável, e mesmo ser impossível para um aposentado que mora em casa ou apartamento alugado. Há também dificuldade na obtenção de tipos de materiais e equipamentos necessários a adaptação das moradias, tais como corrimões e dispositivos de apoio manual para o banheiro.

A manutenção da residência pode ser um grande obstáculo para pessoas idosas, podendo chegar a um estágio em que não possam realizar mais pequenos concertos, dar manutenção a jardins, efetuar operações de limpeza pesada ou reformas, e representam um custo considerável, quando forem prestados por terceiros. No caso de apartamentos o valor do condomínio pode onerar significativamente idosos aposentados.

A prestação de serviços a idosos em sua casa é especialmente importante e em algumas regiões, onde há pouca disponibilidade de pessoas que prestam serviços residenciais, ou mesmo quando os serviços apresentam custos elevados.

Morar perto de serviços públicos, do comércio, templos, igrejas, supermercados, shopingcenters, cinemas é considerado uma grande vantagem por estimular idosos a não permanecerem o tempo todo em casa e realizarem passeios e caminhadas que contribuem para implementar a necessidade de realizar exercícios físicos regularmente.

Ambientes familiares, em que as pessoas sintam-se integradas à comunidade, colabora para que o ambiente seja considerado amigo do idoso por contribuir para sua segurança psicológica. As pessoas que constituem a vizinhança da moradia apresentam um papel particularmente relevante neste aspecto. A perda de vínculos com a família e a comunidade pode ser um problema que precisa ser superado em caso de mudança de residência e é particularmente agravante, em caso de deslocamento para uma nova cidade.

Residir em prédios de apartamentos tende a se constituir em uma perda de contato com os vizinhos e restrições no contato intergeracional, sendo visto como uma desvantagem. Havendo disponibilidade na região, é possível optar por morar em casas ou prédios de apartamentos menores construídos para pessoas idosas, residências para idosos, ou instituições de longa permanência, onde existem oportunidades maiores de socialização. É importante que se faça um planejamento prévio que facilite a interação comunitária do idoso tendo por objetivo reduzir a sensação de isolamento.

O planejamento de medidas para garantir segurança ao ambiente doméstico também representa uma necessidade fundamental, o que é particularmente relevante para idosos que moram sozinhos. Acesso seguro a casa ou prédios de apartamentos, câmaras de vigilância e dispositivos para fazer chamadas de emergência devem ser considerados importantes (Organização Mundial da Saúde 2008).

Segundo Püttmann & Hebgen (1990) é possível mencionar como pontos que merecem consideração na estruturação e organização de residências para pessoas idosas:

No caso de casas e apartamentos:

1-Há uma boa oportunidade de aproveitar plenamente os recursos já existentes na moradia prévia, modernização das instalações e adequação a condição do idoso.
2-Estão disponíveis atualmente dispositivos eletrotécnicos e eletrônicos facilitadores das atividades do cotidiano.
3-É necessário oferecer informações e orientações técnicas para as pessoas idosas em relação a problemas que afetam o seu conforto e a mobilidade dentro de sua residência.
4-É necessário disponibilizar orientações de adequação residencial a idosos para prestadores de serviços que atuam na reforma e construtores que desenvolvem trabalho na construção civil.
5-É recomendável adequar um espaço, (quarto e banheiro), para uma eventual pessoa prestadora de serviços ao idoso que mora sozinho.

No caso de prédios residenciais:

De maneira geral, as características necessárias para que os prédios sejam amigáveis aos idosos são:

1-Disponibilidade de elevadores.
2-Disponibilidades de rampas de acesso.
3-Portas E corredores devem ser amplos.
4-Escadaria não deve ser muito inclinada, degraus baixos e com corrimão.
5-Piso antiderrapante.
6-Vestíbulo dotado de sofás, poltronas ou cadeiras confortáveis.
7-Sinalização de acesso a portaria, elevadores e toalete adequados.
8-Banheiros sociais estruturados para deficientes.

A atenção que deve ser dada a organização de um ambiente residencial amigável a pessoas idosas, tem grande relevância no seu bem-estar diário e qualidade de vida, pelo fato de que permanecem a maior parte do tempo em suas residências. A moradia não só deve proteger a pessoa contra dificuldades trazidas pelo envelhecimento, mas também ser um ambiente que oferece bem-estar.

Para o processo de envelhecimento as pessoas devem se organizar com antecedência. Esta fase da vida pode durar mais de 20 ou 30 anos, período mais longo que a soma do tempo da infância e juventude. Para este processo é necessário uma tomada de decisão antecipada sobre como se deseja morar na velhice. Significa antecipar pensamentos sobre como a moradia poderia ser melhorada, de forma que possa ser usada adequadamente também no tempo futuro do envelhecimento. A melhor época para se tomar esta iniciativa é durante os anos em as pessoas possuem bons rendimentos e ainda possuem bastante energia e disposição para assumir tais tarefas.

2-Barreiras no espaço residencial

Diversos levantamentos realizados com pessoas idosas apontaram as principais queixas relacionadas a barreiras e inadequações que ocorrem no espaço residencial e adjacências. Um estuo realizado nos EUA com 1.100 pessoas com 72 anos de idade indicou como barreiras:

-Cadeiras e vaso sanitário com assento baixo – 14 a 24 % dos participantes.
-Ausência de barras de apoio nos banheiros – 80% dos participantes
-Problemas de iluminação: na cozinha (12%); nos corredores (22%), no quarto de dormir (18%); na sala de estar (18%); no banheiro (12%).
-Ausência de sacadas (20%).
-Espaço de movimentação no banheiro e largura das portas (20 a 30%).
-Acesso inadequado a duchas (74,7%), inadequação das duchas (15%).
-Armários com prateleiras muito altas (80%).
-Estantes altas (42,7%).
-Pisos com superfícies escorregadias (56,7%).
-Indisponibilidade de corrimões em escadas e acessos (83,8%).
-Degraus de escadas demasiado altos ou muito baixos (46,4%).
-Portas externas que fecham muito rápido (55,1%).
-Na parte externa da casa: falta de bancos (89,1%), acesso dificultado a lixeiras (90%);
-Ausência de proteção contra chuva na porta de entrada (91,8%),
-Caminhos com pisos irregulares (47%).
(Wahl & Oswald, 2012).

3-Adaptação do espaço residencial e saúde

Os estudos e pesquisas tem indicado claramente que existe uma interação expressiva entre as condições residenciais e a saúde de pessoas idosas. Neste aspecto interessam em especial os efeitos de adaptações da moradia que possam evitar quedas e interferem na saúde das pessoas. A avaliação das características que constituem barreiras e seus impactos sobre a saúde, indica a importância de intervenções gerontológicas que são disponibilizadas para alterações e adaptações residenciais que minimizem ou eliminem os efeitos negativos sobe o dia a dia de pessoas que envelhecem.

A adequação da moradia depende em parte, apenas de um aconselhamento sobre as possibilidades de ajustes no espaço habitacional, mas também, em situações mais complexas, de investimentos, que nem sempre estão disponíveis no orçamento dos indivíduos. É bastante previsível que a adaptação irá compreender uma crescente incorporação técnica, que inclui funções de sensores, equipamento de informática e monitoramento eletrônico em rede.

Considerando o alongamento do tempo de vida e os efeitos de reduções funcionais que se ampliam com a idade, traz consigo a necessidade continuada de adaptações sistemáticas e otimização dos espaços da moradia. Os estudos indicam que aspectos da vivencia em uma moradia está também ligada a questões subjetivas que se conectam com a saúde da pessoa residente. A pessoa que vivencia a moradia em suas atividades quotidianas, encontra oportunidades de atividades gratificantes e significativas, o que proporciona ao idoso uma condição de bem-estar e níveis mais baixos de depressão. A intervenção gerontológica no campo da adequação do espaço privado é um importante capítulo da Gerontologia Aplicada e que incorpora diferentes aspectos interdisciplinares e multiprofissionais, sobre quais o Gerontólogo está apto a contribuir.

4-Fontes de consulta

MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL –Secretaria de Estado da Assistência Social, Portaria SEAS nº 73, 10/05/2001. Estabelece normas de funcionamento de serviços de atenção ao idoso no Brasil (www.mpsp.mp/portal/page/portal)

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Guia Global: Cidade Amiga do Idoso, Genebra, OMS, 2008

RATCLIFE,J. Town and Country Planning, London University College London Press,1992

PÜTTMANN,H. & HEBGEN,H. Älter werden am liebsten zu Hause – Nützliche Hinweise Für das Wohnen im Alter, Heidelberg, Energie-Verlag GmbH, 1990

WAHL, W. & OSWALD, F. Wohnen, Wohnraumanpassung und Gesundheit. In: Wahl, H, W., Römer, C,T. & Zoegelmann, J,P. Angewandte Gerontologie, Stuttgart, Kohlhammer, 2012

 


Sobre o autor:

Nelson Frederico Seiffert

Doutor em Engenharia de Produção, com a tese de Doutorado sobre Gestão Ambiental. Trabalhou em Pesquisa na EMBRAPA durante 25 anos.

Desenvolve atualmente estudos na área de Gerontologia Ambiental e Aplicada. Conduziu Seminários sobre Gerontologia Ambiental e Aplicada no NETI/UFSC em 2015, 2016 e é Diretor Técnico Científico da ANG/SC – GESTÃO 2017/2019.

E-mail: [email protected]

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